Como Xi Jinping governa a China com poderes absolutos
No 20º Congresso do Partido Comunista Chinês, em outubro de 2022, o presidente Xi Jinping estendeu formalmente seu governo por mais cinco anos, com a possibilidade de que este período se prolongue ainda mais. O fato é inédito, desde os tempos de Mao Tsé-Tung.
Jenni Marsh, editora da Bloomberg, informou detalhes sobre o congresso, onde mais de dois mil delegados do Partido Comunista Chinês se reúnem, a cada cinco anos. Durante essas reuniões, eles supostamente elegem seu secretário-geral, entre outros cargos do alto escalão do governo.
Xi Jinping não apenas anunciou seu terceiro mandato na reunião, como não mostrou "nenhum interesse no planejamento de um possível sucessor", segundo o The Economist.
Além disso, o líder chinês também nomeou vários políticos chineses leais a ele, como informou o The Guardian. São os homens mais poderosos da China.
Em um incidente notável durante a cerimônia de encerramento, um ex-membro sênior do partido, Hu Jintao, 79, foi misteriosamente escoltado para fora da reunião.
Não houve nenhuma explicação por parte do governo chinês para o afastamento de Hu da reunião. Segundo a BBC, a agência de notícias estatal chinesa, Xinhua, garante que Hu estava doente. No entanto, sabe-se que ele tem ideias muito diferentes de Xi Jinping, não apenas dentro do partido, mas também sobre a sociedade e a internet, como disse o professor Henry Gao, da Singapore Management University, no New York Times.
"Dado o cuidado com que essas reuniões são ensaiadas e organizadas, o fato de isso ter acontecido na frente de todos, inclusive da mídia, é o que mais nos chama a atenção", disse o professor Gao. O caso poderia ser interpretado como a demissão pública de um oponente.
O The Guardian relata que Xi Jinping tem "poder absoluto". Vários meios de comunicação, incluindo The Atlantic e Politico, comparam seu poder ao de um imperador, enquanto a ABC o rotula de "imperador vermelho".
De acordo com Jenni Marsh, "o presidente Xi Jinping acumulou tantos títulos que poderia ser chamado de presidente de tudo".
No entanto, entre os muitos títulos que ele acumulou, um deles se destaca. Trata-se do termo 'Lingxiu', ou 'líder', anteriormente reservado apenas para Mao Tsé-Tung. Segundo informa a revista Bloomberg, "Xi ganha terreno entre a elite do Partido Comunista e levanta temores de um possível culto à personalidade, semelhante ao que ocorria com Mao".
Líderes como Deng Xiaoping (foto) implementaram um sistema, na década de 1980, para garantir que não haveria repetição do governo, mas Xi Jinping reintroduziu a possibilidade de governar para sempre, explicou Jenni Marsh.
Em 2021, uma resolução histórica do Partido Comunista Chinês já elevava Xi ao mesmo status histórico de Mao Tsé-Tung e Deng Xiaoping.
Xi Jinping nasceu em Pequim, em 1953. Seu pai, Xi Zhongxun, fez parte da primeira geração da liderança comunista chinesa e era considerado um moderado dentro do partido, o que trouxe muitos problemas, tanto para ele como para sua família.
Xi, o atual presidente da China, estudou Química na Universidade de Tsinghua, de 1975 a 1979, e começou a entrar para o mundo político nas décadas seguintes. Na foto, vemos Xi Jinping, em 2000, como governador da província de Fujian.
Xi Jinping sucedeu Hu Jintao, em 2012, nos 3 principais cargos da elite política de seu país: presidente da China, secretário-geral do Partido Comunista Chinês e presidente da Comissão Militar Central. Isso fez dele o líder supremo do país.
Ao contrário de seus predecessores diretos, Xi Jinping contornou o sistema moderado e coletivo do governo e centralizou o poder em suas próprias mãos.
De acordo com o The Wall Street Journal, "o presidente da China incentiva o culto à personalidade e já projetou a remoção dos limites de mandato, permitindo que ele seja um governante vitalício". Xi Jinping conseguiu, inclusive, introduzir seu pensamento político na Constituição chinesa.
A remoção dos limites de mandato também impede a renovação geracional, costumeira na liderança chinesa. Em vez de abrir espaço para sucessores mais jovens e modernos no Partido Comunista, algo que poderia ter ocorrido em 2022, Xi estendeu seu governo por pelo menos mais 5 anos e potencialmente por toda a vida.
Sob seu governo, Xi Jinping solidificou o lugar da China como uma superpotência global. O país ultrapassou os Estados Unidos como a maior economia do mundo.
O governo chinês lançou a Iniciativa do Cinturão e Rota em 2013, um grande projeto de infraestrutura em mais de 70 países. O projeto foi descrito pelo The New York Times como "a espinha dorsal da agenda econômica e geopolítica da China".
No entanto, o crescimento tecnológico e econômico não incluiu o fomento dos direitos humanos e sociais. De fato, alguns especialistas em política externa, como Jonathan Tepperman, argumentam que Xi Jinping desmantelou "metodicamente quase todas as reformas que tornaram possível o espetacular crescimento chinês nas últimas quatro décadas".
O controle mais rígido da mídia e da população estão diretamente ligados à abordagem centralizada do governo de Xi. A NPR aponta que o país introduziu regras de mídia mais rígidas em 2021, que vão desde limitar as horas de jogos online até proibir a aparição de homens "efeminados" da TV.
Sob o pretexto de uma forte identidade nacional, o governo central também reprimiu grupos minoritários, como os uigures, na província ocidental de Xinjiang.
A Al-Jazeera relata que o 'Pensamento Xi Jinping' foi incluído no currículo escolar chinês, procurando "estender o culto à sua personalidade para crianças de até sete anos e, assim, criar uma nova geração de patriotas".
Entre os 14 princípios do Pensamento Xi Jinping está o domínio total do Partido Comunista, em todos os aspectos da vida: "O governo, os militares, o povo e as universidades, o partido lidera tudo."
A única maneira de parar Xi Jinping, segundo Mitter, seria forçá-lo a renunciar, algo que só poderia ser feito pela própria elite política que apoia sua filosofia como "marxismo para o século XXI" e "a essência da cultura chinesa e do espírito da China".
A Al-Jazeera diz que "o sonho chinês é inseparável de um ambiente internacional pacífico e de uma ordem mundial estável". Mas o que isso realmente significa: uma ordem dominada pela China ou uma em que ela divide o poder com os EUA?
Alguns pensam que os Estados Unidos e a China já entraram em algum tipo de guerra fria. Na última década, as tensões entre as duas nações aumentaram.
O território autônomo de Taiwan, uma nação insular que a China considera oficialmente como uma província separatista, pode ser um ponto de discórdia entre Pequim e o Ocidente.
O presidente Joe Biden afirmou, em outubro de 2021, que os Estados Unidos defenderiam Taiwan, caso a China fizesse o primeiro ataque. Além disso, a líder da Câmara, Nancy Pelosi, visitou a ilha em agosto de 2022, um gesto que Pequim considerou como uma provocação.
O governo chinês desenvolveu laços mais estreitos com Vladimir Putin e com a Rússia, na última década. Xi Jinping disse, em mais de uma ocasião, que Putin era, no cenário internecional, "seu melhor amigo".
No entanto, o governo chinês adotou uma postura neutra e distante com relação à guerra na Ucrânia, distanciando-se da Rússia. Já os EUA, a União Europeia e seus aliados impõem severas sanções a Moscou e seus oligarcas.
The Guardian considera improvável que haja um conflito entre os Estados Unidos e a China, já que ambos dependem um do outro economicamente.
Xi Jinping tem todas as condições para permanecer no poder por muito tempo: rivais políticos neutralizados, um forte controle sobre a sociedade chinesa e poucas chances de haver problemas internacionais.
Independentemente do tempo que permaneça no poder, já é certo que Xi deixou um efeito duradouro em todo o mundo. Ele certamente será lembrado como um dos líderes mais importantes e influentes da China moderna.