Milei coloca centros de tortura à venda na Argentina e causa indignação
O presidente da Argentina, Javier Milei, colocou à venda 309 propriedades estatais que serviram como centros clandestinos de tortura e detenção durante a última ditadura argentina, que durou sete anos, de 1976 a 1983, informa a CNN.
A Escola de Mecânica da Marinha (ESMA), localizada em Buenos Aires, foi um dos principais centros de tortura, detenção e desaparecimento forçado de pessoas durante a última ditadura na Argentina.
A ESMA, um local emblemático, tornou-se um símbolo do terrorismo de Estado e constitui uma peça de prova fundamental nos julgamentos de crimes contra a humanidade no país. Por esta razão, foi declarado Patrimônio Mundial pela UNESCO em 2023.
O decreto 950/24 de Milei, lançado em outubro, fala na alienação de 309 imóveis em todo o país, que serão publicados no site da Agência Estadual de Administração de Imóveis (AABE) para serem vendidos ao maior lance em leilão público.
Na Argentina, os locais ligados ao terrorismo de Estado que são recuperados e convertidos para atividades culturais e de promoção dos direitos humanos são conhecidos como Espaços de Memória, onde se realizam tarefas pedagógicas e pesquisas históricas e judiciais em profundidade.
A decisão, argumenta o decreto, visa “reduzir custos e despesas” causados pela manutenção de edifícios, como La Perla Chica, adjacente a La Chica, um dos maiores centros de detenção e tortura da província de Córdoba.
A diretora do Espaço de Memória da cidade de Córdoba, Julia Soulier, diz ao Página 12 que Milei não vai conseguir o que quer. "Eles jogam fora e reviram tudo que é política pública de direitos humanos e marcas de memória”.
Um dos imóveis mais atrativos para os compradores é o antigo Regimento de Infantaria número 9 localizado em Corrientes, classificado como apto para promover um plano urbanístico costeiro. O local foi um centro de tortura desde setembro de 1976 e já possui um Espaço de Memória com visitas guiadas que conta com proteção legal, explica a CNN.
Organizações de defesa dos direitos humanos de Corrientes, sobreviventes e familiares de vítimas da ditadura pedem proteção à Justiça para que o antigo regimento não seja vendido. “A alienação do imóvel implica o apagamento dos vestígios do que aconteceu ali”, afirma o requerimento judicial, segundo o jornal Tiempo Argentino.
Outro dos centros em leilão é o Campo de Mayo, a apenas 30 quilômetros de Buenos Aires. É uma grande instalação militar onde o Estado reconheceu que funcionavam vários centros ilegais. Dos mais de 4.000 presos que por ali passaram entre 1976 e finais de 1978, apenas trinta sobreviveram, indica o El País.
Mauricio Macri, ex-presidente argentino, queria construir no Campo de Mayo, que possui 5.000 hectares, uma reserva natural onde “as famílias poderão beber mate e praticar esporte”, uma medida a que as organizações de direitos humanos se opuseram.