Trigo no mundo está em perigo: podemos evitar o desastre?
Por décadas, cientistas de alimentos correm contra o tempo para criar uma variedade de trigo que possa manter ou aumentar o rendimento de suas colheitas.
Por conta das mudanças climáticas, a Argentina e a Austrália, que estão entre os maiores produtores mundiais de trigo, sofreram fortes consequências. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em 2022, a Argentina diminuiu, consideravelmente, a quantidade de trigo produzida e, na Austrália, o cultivo sofreu uma queda na qualidade do cereal.
A diminuição da produção de trigo em outros países estimulou o aumento da colheita do cereal brasileiro. Um levantamento divulgado pela Conab informa que "a produção de trigo em 2022 atingiu um novo recorde, com 9,5 milhões de toneladas, o que representa um aumento de 23,7%, em relação à safra passada".
Foto: Unsplash/ matheus pereira
À medida que entramos em um período de insegurança alimentar mundial, causada pelas mudanças climáticas, urge encontrar novos meios de produção de certos alimentos, como é o caso do trigo, para que aguentem temperaturas mais altas.
“O trigo ocupa 17% do total de terras cultivadas no mundo, que faz dele a maior prudução do planeta ”, de acordo com o Centro Internacional de Pesquisa e Desenvolvimento (IDRC).
O cultivo mais popular do mundo é tão importante que alimenta cerca de 35% da população mundial e fornece à humanidade mais calorias e proteínas do que qualquer outro alimento citado pelo IRDC.
Mas, apesar de todos os esforços, uma má colheita de trigo pode representar o maior desastre iminente que a humanidade já enfrentou.
O editor de ciência do The Guardian, Robin McKie, escreveu: “Graças ao aquecimento global induzido pelo homem, nosso planeta enfrentará um futuro com ondas de calor cada vez mais severas, secas e incêndios florestais que podem devastar colheitas inteiras, provocando fome generalizada”.
O trigo é uma das plantas que não se adequa bem a temperaturas elevadas. Os cientistas preveem que a produção de trigo pode enfrentar uma queda significativa nos próximos anos.
Em um estudo de 2022, publicado na revista Nature, pesquisadores descobriram que o rendimento do trigo, ao longo da história, diminuiu entre 3,6% e 7,1% por cada grau Celsius de aquecimento, dependendo da cepa e da época do ano.
A comprovada queda de rendimento do trigo com o aumento da temperatura é informação suficiente para alarmar as autoridades, que deverão encontrar uma saída rápida, para evitar a falta de alimento.
Mas o aumento do calor não é o único problema a ser enfrentado pelas plantações de trigo, nas próximas décadas.
De acordo com um estudo de pesquisadores de Harvard, publicado na revista científica Science Advances, “o aquecimento global pode causar grandes secas em 60% das áreas de cultivo do trigo, em todo o mundo”.
“Mesmo que a meta do Acordo de Paris seja atingida, estabilizando a temperatura em 2 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais, a escassez severa de água ainda dobraria, nos próximos 20 a 50 anos”, escreveu o correspondente administrativo do estudo, Rhea Grover.
Por isso, cientistas de alimentos trabalham para desenvolver um novo tipo de trigo e, assim, evitar a crise alimentar, que ameaça deixar milhões com fome.
Resistente ao calor, o novo cereal poderá suportar altas temperaturas, garantindo uma boas safras para as próximas gerações.
A boa notícia é que, um grupo de pesquisadores, liderados pelo professor Graham Moore, no John Innes Center, em Norwich, Inglaterra, pode ter encontrado a solução. Eles têm trabalhado na criação de uma variedade de trigo resistente ao calor e à seca.
Moore e sua equipe identificaram um gene-chave em uma de suas amostras de trigo, rotulado como Zip4.5B, que poderia permitir que as futuras safras de trigo mantivessem seus rendimentos, mesmo com o aumento da temperatura.
A equipe do John Innes Center apelidou sua descoberta de "santo graal dos geneticistas do trigo". Trata-se de uma versão mutante da colheita e agora pretendem testá-la.
“Vamos fazer testes em diferentes variedades de trigo. Eles serão cultivados na Espanha, em terras perto de Córdoba, para ver como se saem”, disse Moore, em entrevista ao The Guardian.
“O objetivo será identificar quais variedades sobreviverão melhor às temperaturas mais altas, porque este é o cenário que nossos agricultores experimentarão nas próximas décadas”, continuou Moore.
Moore acrescentou ainda: “O trigo desempenhou um papel notável na história da humanidade, espero que nosso trabalho ajude a manter sua importância, como um alimento do futuro”.